Diamantes de Sangue*

* Texto publicado hoje no Jornal do Centro

     1. O 25 de Abril foi há 39 anos. Nestas quase quatro décadas, três resgates. As duas primeiras intervenções do FMI, em 1977 e 83, ainda se podem atribuir às verduras da terceira república, mas a bancarrota de 2011 — depois do dilúvio de fundos comunitários e de receitas das privatizações -, deve-se integralmente à corrupção e incompetência das elites políticas e económicas.

     2. Quando há notícias de uma viagem das elites portuguesas a Angola há quem se interrogue: “mas afinal eles vão lá ensinar ou aprender?”
     Estas “trocas pedagógicas” entre os dois países lusófonos têm bom e têm mau. Bom é o trabalho do jornalista angolano Rafael Marques. Mau é o processo que nove generais angolanos lhe moveram a ele e a Bárbara Bulhosa, da editora Tinta-da-China, por causa de “Diamantes de Sangue”.



     Este livro descreve a desumanidade com que são tratadas as populações das regiões diamantíferas, onde até as estradas são privatizadas pelas companhias e vedadas ao trânsito particular. O livro documenta 109 casos de tortura e/ou assassinato.
     Um caso contado no livro: como as estradas que servem Ngongo Ngola e Tximbulagi foram privatizadas, as pessoas têm que atravessar o rio Cuango numa bóia amarrada por uma corda a uma árvore em cada margem. Esta bóia leva oito pessoas numa travessia precária e perigosa que tem que ser feita na zona com a corrente mais forte por aí não haver jacarés. Os desastres mortais são frequentes.
     Os generais angolanos, ao exigirem em tribunal uma indemnização de 300 mil euros, estão acima de tudo a fazer um aviso à edição portuguesa — se publicarem coisas destas, têm dissabores no futuro.
     Quem ama a liberdade deve-lhes responder tornando este livro um best-seller. Lê-lo é ficar a saber como funciona a cleptocracia angolana, lê-lo é afirmar a liberdade de expressão que conquistámos com o 25 de Abril.

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