Presidenciais*

* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente dez anos, em 5 de Agosto de 2005


1. Tem-se falado pouco das eleições presidenciais de Janeiro próximo que, para o país, são bem mais importantes que as eleições autárquicas.

Tudo o que aconteceu à volta da deserção de Durão Barroso e do exercício de Pedro Santana Lopes como primeiro-ministro deu-nos suficientes provas da necessidade de termos em Belém um político de carácter e de força nas convicções.

A Presidência da República é uma válvula de escape dos bloqueios da nossa democracia e, quando necessário, deve fazer de fusível. Devia-o ter sido em Julho de 2004, aquando da fuga de Barroso para Bruxelas.

2. Na altura, Jorge Branco Sampaio deixou que o poder passasse monarquicamente de Durão Barroso para Pedro Santana Lopes.

A partir daí, tem tido um final de mandato presidencial penoso. A ida de Jorge Sampaio à Cova da Moura contactar com os imigrantes, em período de alguma tensão racial no país, ficou como uma marca boa num segundo mandato decepcionante.

3. Como resultado, percebeu-se que as Presidenciais de 2006 iriam ser influenciadas por este pecado original: as pessoas não iam querer em Belém um presidente fraco. Parecia estar lançado o tapete vermelho a Cavaco, com a sua imagem de homem duro.

Alertei para este perigo aqui, no Olho de Gato de 24 de Setembro, há quase um ano. A evolução política posterior, com a vitória de José Sócrates, não alterou o panorama. A nossa direita, esfrangalhada eleitoralmente pela catástrofe santanista, tenderá a ver as presidenciais como uma oportunidade de vendetta e de ajuste de contas. Para isso, com a candidatura de Cavaco, a direita tudo fará para crispar artificialmente o país.

4. José Sócrates fingiu que estava a hibernar na questão presidencial, especialmente a partir da altura em que o Engenheiro Guterres decidiu candidatar-se ao lugar de Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados. Mas Sócrates não estava a dormir. Viu-se na forma como o primeiro-ministro, em dois dias, pôs o PS a apoiar Mário Soares.

5. Mário Soares protestou contra a vergonha da Cimeira dos Açores; com Soares não havia GNR no Iraque; com ele, Pedro Santana Lopes tinha ficado Presidente da Câmara de Lisboa, e só isso.

O país sabe com o que pode contar com Mário Soares na Palácio de Belém. Soares esteve lá dez anos e as pessoas gostaram do seu desempenho presidencial.

6. Por sua vez, Cavaco Silva, como Presidente da República, é uma enormíssima incógnita. Como vai ele relacionar-se com os Governos?

Cavaco Silva, agora, vai ter que mostrar o que vale e vai ter que dar garantias aos portugueses que não é o Cavaco autoritário e populista da primeira metade dos anos 90.

Não está esquecido o Cavaco dos tabus, o Cavaco do “só leio cinco minutos de jornais por dia”, o Cavaco do “nunca me engano e raramente tenho dúvidas”.

Para começo de conversa, no mesmo dia em que anunciar a sua candidatura, é importante que Cavaco Silva se comprometa com os portugueses, caso venha a ser eleito, a viabilizar um referendo sobre a despenalização do aborto.


Fotografia daqui
7. Helen Thomas é uma lenda do jornalismo mundial. Trabalhou para a UPI, como jornalista acreditada na Casa Branca, mais de 40 anos.

Em desabafo recente, disse ao seu amigo Albert Eisele, editor do jornal “The Hill”, de Washington: “No dia em que Dick Cheney se candidatar para presidente, eu mato-me. Só nos faltava mais um mentiroso…”

Vai daí, Eisele publicou o comentário de Helen Thomas na sua coluna. Com amigos assim…

8. Na Galeria da Acert, em Tondela, até 30 de Setembro, está uma exposição de desenhos e pinturas de Luís Calheiros. O caso é raro. A última exposição individual do pintor foi em 1988.

A minúcia da arte de Luís Calheiros e o seu sentido de humor merecem uma visita dos leitores. Vão sair da sala, de certeza, com um sorriso nos lábios.

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